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quarta-feira, 12 de março de 2025

PARQUE DA JAQUEIRA

Derrubada de pista de bicicross da Jaqueira pode acabar com projeto voltado para crianças e jovens

A concessionária, Viva Parques Recife, pretende substituir a pista por uma área voltada para restaurantes (foto: Marina Torres/DP Foto)


"São meninos do Morro da Conceição, do Alto Zé do Pinho. Não vão comer no restaurante", afirma treinador Gilmar Batista dos Santos que dá aulas gratuitas no local


Quando tudo ao redor eram casas, já estava cravado no coração do Parque da Jaqueira, na Zona Norte do Recife, uma das mais tradicionais pistas de BMX de Pernambuco – que, agora corre o risco de ser derrubada. Há quarenta anos, foi o treinador e ex-atleta Gilmar Batista dos Santos que solicitou ao então prefeito do Recife, Joaquim Francisco, apoio para transformar um antigo espaço de recreação em uma área para prática da modalidade de ciclismo radical, que se tornou olímpica em 2008. 

“Pedi permissão para a gente transformar em uma pista de competição. Vimos o bairro mudar completamente. E hoje está aí essa maravilhosa pista, que formou vários pilotos que representam a gente”, conta. No local, Gilmar dá aulas do esporte de maneira gratuita a mais de trinta alunos oriundos de bairros periféricos do Recife e, diante da concessão do parque à iniciativa privada pelos próximos trinta anos, ainda não tem certeza do destino da escolinha de BMX. 

A concessionária, Viva Parques Recife, pretende substituir a pista por uma área voltada para restaurantes. “São meninos do Morro da Conceição, do Alto Zé do Pinho. Não vão comer no restaurante”, lamenta. O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) já foi acionado e deverá instaurar um procedimento para tratar do tema. 

De acordo com Gilmar, o projeto social da escolinha é essencial para dar perspectiva de vida aos jovens que escolhem praticar o esporte. “Se esses meninos não estiverem aqui, vão fazer o quê? Eles veê aqui e a gente vai criando cidadãos. O coração ainda está a mil. Ainda estou à base de remédios, mas entreguei tudo na mão de Deus, lamenta. O treinador lembra que vários pilotos profissionais da modalidade saíram da pista da Jaqueira, que chama de “nave-mãe”. “Até atletas olímpicos, como o nosso Pedrinho Queiroz, que começou aqui na Jaqueira com quatro anos de idade e hoje mora em São Paulo. Muitos atletas vão embora daqui por falta de incentivo”, acrescenta. 

Um dos alunos da escolinha de Gilmar, Cauã Nascimento, de 14 anos, sai do Morro da Conceição com destino ao Parque da Jaqueira todos os dias, motivado pelo sonho de se transformar em um atleta profissional. “Eu entrei desde os 12 anos. Quando recebi essa informação fiquei bem triste, porque eu cheguei aqui há muito tempo, pra ficar com essa pista e sair pra outro mundo”, comenta o garoto. 

Dono de manobras ágeis e boa impulsão nos saltos, ele se inspira em um amigo, chamado Riquelme, que se mudou para a Bahia recentemente em busca de melhores condições para a prática do esporte. “Quando comecei, minha mãe ficou com medo, mas falei a ela que ia continuar, que gosto muito desse esporte. Vai ficar difícil, mas vou ficar com Gilmar. Cheguei aqui com ela [a pista] e pensei que ia terminar com ela, mas vai destruir ela e eu não sei mais”, lamenta Cauã. 

Na área de largada, o treino de Cauã é acompanhado com atenção pelo veterano Caio César Barreto, de 26 anos de idade, que pratica BMX na Jaqueira desde os 12 anos. “Meu grande incentivador foi Gilmar, que me ensinou o que é o bom na vida: praticar esporte. Hoje eu pratico mountain bike XCM, mas a semente foi plantada aqui e colhi bons frutos”, ressalta. César conta que a prática esportiva o ajudou a sair de um quadro depressivo. “Saúde é primordial para o equilíbrio na vida e isso daqui é o que me deixa vivo. Mantém a chama acesa”, completa. 

De acordo com Gilmar, a Viva Parques sugeriu a mudança de sua escolinha para a pista de BMX do Parque Santana, que também foi concedido pela Prefeitura do Recife à empresa. “A gente está lutando e tentando negociar o futuro do nosso esporte, que é o BMX”, frisa. Praticante de BMX e usuário da pista, o piloto Tarta de Melo ressalta que a pista do Parque Santana não oferece as mesmas condições de treinamento para a formação de novos praticantes. 

“A pista da Jaqueira tem um nível mais baixo de dificuldade, que atende melhor aos iniciantes. É uma pista técnica, porém as rampas são medianas e isso facilita o aprendizado. Já as rampas do Parque Santana são maiores, com uma descida mais alta e inclinações maiores”, explica. Em busca de maior transparência quanto aos planos da concessionária para o espaço da pista de BMX, foi Tarta que registrou uma denúncia-queixa ao MPPE. 

“A gente foi pego de surpresa com essa notícia. O Parque da Jaqueira é uma unidade de conservação da paisagem e a gente não pode querer mexer ou modificar a identidade dele. A pista faz parte dessa identidade, como os jardins de Burle Marx e a Igreja. Isso não quer dizer que não possa agregar melhorias. A gente quer a permanência desse equipamento, que precisa ser tombado. Quarenta anos não são quarenta dias”, destaca.  Por meio de nota, o MPPE confirmou que recebeu a denúncia, através da 20ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital (Habitação e Urbanismo). “Será instaurado o procedimento pertinente e solicitadas informações às autoridades municipais, para as providências preliminares”, disse o posicionamento oficial da instituição.

Por: Marilia Parente

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